sábado, 31 de outubro de 2009

Revista VEJA, 8 de novembro de 1995




Paulera pornô

Raimundos baixam calão e aumentam o som.

Raimundos: O CD tem rock com humor de vestiário de adolescentes

Chega nesta semana às lojas Lavô Tá Novo, o segundo disco dos Raimundos, grupo que bagunçou o rock brasileiro em vários sentidos. Primeiro, por criar um tipo de música que nunca ninguém tinha feito antes, o estapafúrdio forrocore, mistura de forró com hardcore. Segundo, por ter emplacado vários sucessos no rádio, apesar das letras de baixo calão. Terceiro, por ter vendido 200 000 cópias num momento em que nenhum roqueiro brasileiro vendia tanto, muito menos saindo de um selo independente. Todo esse sucesso foi conseguido apesar de os Raimundos fazerem uma barulheira dos diabos. Quase sempre, quem começa com tanto fôlego acaba perdendo o gás em seguida e decepciona na hora da prova dos nove. Não é o caso dos Raimundos, que com o segundo disco chegam ao merecido posto de melhor banda brasileira no gênero que praticam - o do rock sujo e pesado. Vale dizer: eles são os melhores do pior. Esse galardão ambíguo vale tanto para as músicas como para as letras.

Quem é fã do Sepultura pode discordar, mas os Raimundos têm cabedal para ficar em primeiro do pódio. O Sepultura é brasileiro por acaso. Eles cantam em inglês, moram nos Estados Unidos, são contratados por uma gravadora holandesa e fazem mais shows no exterior do que por aqui. Os Raimundos cantam em português, com sotaque nordestino, tiram sua inspiração de temas brasileiros e fazem sucesso pelo país, não fora dele. Gravam com o sanfoneiro Zenilton, usam a malícia picaresca da cultura popular e fazem um som pesado para adolescente nenhum botar defeito.

Ao ler o que vai no encarte de Lavô Tá Novo, qualquer pessoa civilizada pode torcer o nariz - e com toda a razão. As letras são chulas, de mau gosto, sem nenhuma sutileza ou inteligência. Se fosse nos Estados Unidos, viria com uma advertência na capa, alertando aos pais sobre a pornografia e o incentivo à maconha. A exemplo dos Mamonas Assassinas, que vieram na trilha aberta pelo primeiro CD dos Raimundos, o grupo tira inspiração para seus "poemas" do linguajar de adolescentes no vestiário. Um deles é um chavão conhecido nos ginásios de todo o Brasil, que fala de um trem, uma manivela e um delegado. Os garotos cantam essa pérola da baixaria há décadas, mas nunca ninguém teve a pachorra de gravá-la em disco. Os Raimundos levam a sério uma qualidade que, segundo o antropólogo Roberto DaMatta, é tipicamente brasileira: o gosto pela safadeza. A música vulcânica e a combinação criativa de ritmos fazem de Lavô Tá Novo um dos mais barulhentos e bem-feitos petardos do rock nacional neste ano.




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